26.7.06

Sandman - Um Jogo de Você



''Um Jogo de Você'' é um jogo no qual todos nós participamos , o real desafia a solidez de nossas identidades com vários desafios de variadas ordens, política,social,religiosa,etc

Afinal quem é você?você é a irmã do seu irmão o filho de seu pai, ou você é de fato você?

Cada ser humano possui esse conflito dentro de si,tentando escapar do kitsch,da sua própria banalização ,penso q ele age de maneira singular em cada sexo,como “zeit e geist” é como se no homem o sonho teria o poder de desloca-lo à alturas inimagináveis ,se um homem nega seu sonho ele cai em profunda angústia ,sua vida perde aquele sentido ardente de antes.

Nas meninas parece ocorrer o contrário , o sonho as afasta do real,enclausurando as em mundo fantástico de estética predominantemente banal,uma espécie de”sonho auto-ajuda”.

Em nossa atual época, os desafios do jogo da identidade são multiplicados ao máximo, o ser humano sente grande dificuldade de ficar acima de um mundo todo descontínuo e aparentemente sem sentido,um mundo que mais parece hoje ser protagonizado por objetos e não mais por ser humanos como é ilustrado por Baudrillard em “O Sistema dos Objetos”,hoje o objeto precede o humano ao invés de ocorrer o contrário,o humano torna-se algo mais funcional do que essencial,se adaptando a funções e não a fins,as pessoas ganham uma segunda função, a de elementos de combinação do jogo da identidade.

Outra coisa interessante para se notar é que em Sandman-Um Jogo de Você, o mundo real as vezes parece mais fantástico e bizarro do que nos sonhos,o mundo real é um delírio de inúmeras realidades singulares se chocando a cada momento e alterando o fio narrativo da estória.

Há alguns elementos de paródia como a protagonista bela e cativante de nome Barbie que consegue triunfar no final e a tia “num-gosto-de-cachorro” ,única personagem negra e que morre no final, acho que isso foi feito como uma tentativa de crítica a hq’s mais tradicionais e conservadoras.

A edição brasileira conta com um ótimo prefácio e no final temos extras ,com informações muito interessantes da equipe de produção tais como :

“Dave McKean(capas e desing)tinha como brinquedo predileto um peixe feito de lã.Seu nome era Peixe.Hoje,sua brincadeira predileta é forçar copiadoras a fazerem coisas para as quais não foram projetadas e nunca sonharam que seriam capazes de fazer”

21.7.06

Sangue Ruim



Aqui temos acompanhadas das ilustraçoes de Joe Coleman, quatro contos curtos,todos fatos verídicos como manda uma tradição norte-americana nos quadrinhos de só apresentar material de crimes verdadeiros,tradição que já vem desde o século XV,segundo consta nas informações da edição brasileira.
A obra é uma literatura diferente,acho que semelhante a obra "O Vampiro que Ri",por apresentar protagonistas oriundos dos submundos ,aqui não há interferencia alguma do autor nos relatos(ou aparentemente pelo menos não notei isso nos contos 1,3 e 4),eles são desconcertantemente crus ,deixando para o leitor o trabalho de se decidir sobre o valor da obra lida e sua opnião sobre os atos praticados.
Não há nenhuma glamourização de práticas como estupro,assassinato,roubo, ações que estão presentes no comportamento humano há muito tempo,ilustrados até na Bíblia,como no caso dos irmãos Caim e Abel.



"Eles não eram marginais,eram deuses antigos,demônios do inferno se vingando por terem nascido neste planeta que mais parece uma ferida cheia de pus,o meu coração de criança se identificou imediatamente.Eu finalmente soube o que queria ser."


Os personagens narram suas histórias de uma maneira trágica,as vezes como vítimas dos horrores que viveram e que comprometeriam sua sanidade e em outros casos fascinados desde crianças pelo mundo dos criminosos, como Paul John Knowles e Jack Black.
Os dois últimos contos,são em minha opnião os mais contundentes e perigosos,mostrando personagens afundados em um caminho terrível e totalmente sem volta,o conto sobre Carl Panzram realmente me deixou atormentado,um cara totalmente desacreditado na sua humanidade , revoltado ao máximo ,desejava que toda a população mundial tivesse só um pescoço afim de estrangular e acabar com ela de uma só vez.

"Joe Coleman é um homem das cavernas em uma espaçonave"(Charles Manson)


"O homem vivendo entre lobos, sente inevitável necessidade de também ser lobo"

Burst City


Esse filme é demais,quase que eu choro enquanto assisto, na minha humilde opnião tudo em Burst City funciona muito bem, tem umas tomadas com a camêra em uns ambientes escuros, mostrando sangue nas paredes e uma trilha sonora muito paranóica no fundo,shows com punk rock,pancadaria com a polícia,prostituição nos submundos da cidade,poderes paranormais(tipo tetsuo)tem de tudo nesse filme maravilhoso.
Têm se até a impressão de que o filme é muito grande, ele não segue aquelas linhas de roteiro mais tradicionais,tão comuns em tantos filmes, é bem fragmentado aliás, mostrando as várias camadas sóciais da cidade ficcional(a mesma do título,Burst City),os operários(que parecem ser uns ciborgues),os chefões do crime, a polícia,etc
O filme me fez lembrar bastante de outros filmes japoneses, como Dead or Alive,Ichi the killer e Tetsuo.Tem umas tomadas de câmeras que me lembram muito o estilo do Miike.
O Filme é como um manifesto punk-rock bem energético, mostrando fôlego ate o fim ,com bastante coisa acontecendo, revolta dos operários mal tratados(no final tem uma pancadaria do caralho com a policia huahua,só vendo).
A trilha sonora merece especial destaque, não só os shows de punk-rock quebradeira, mas as trilhas sonoras de fundo,soando algo meio industrial e primitivo na falta de melhor definição, também lembra muito a trilha sonora de Akira.
Pena que o filme não tenha legenda,pelo menos eu procurei muito e não achei, mas apenas a experiência visual de assistir compensa muito
Outra coisa que eu queria escrever, no filme uma relação interessante e diferente entre objeto e homem é mostrada, há ainda uma valorição criativa do objeto por parte dos habitantes do submundo japonês, os objetos são utilizados como prolongamentos do corpo, as habilidades adcionais dos ciborgues como uma maior força para dar vazão a sua revolta perante as más condições de trabalho,os carros como uma diversão e uma hierarquia entre quem os dirige melhor durante as corridas,aqui os objetos ainda são usados para um beneficio saudável,os habitantes do submundo tem uma percepção diferente do sistema dos objetos,bem mais divertida do que a maioria das pessoas.

1.7.06

O Vampiro Que Ri

(que capa!)

A atrocidade como arte e estudo do comportamento humano, o que a vida sugere para as classes mais baixas mostrada de uma forma sutil ,cheia de influencias artísticas como expressionismo alemão,surrealismo, tudo isso criando um clima onírico e atormentador.

Na tentativa de identificar as influências do trabalho de Maruo críticos e apreciadores de sua arte dizem também ser clara a influência do “ Théâtre du Grand-Guignol”, um teatro feito na França ,aparentemente feito com temas dramáticos, de estética grotesca e macabra , possuidor de agudo humor negro.

Também é dada como certa a influencia das e-muzan,gravuras grotescas de grande fama no Japão do séc. XIX, nota se que a arte de Maruo tem um traço mais clássico do que a maioria das hq’s japonesas,nesse caso “o vampiro que ri” corresponde ao gênero dos “gekigas”(guequiga),quadrinhos mais adultos e menos “inocentes”.

Outra caracteristica que diferencia OVQR dos mangas é com certeza a arte, muito detalhada ,até os objetos e planos de fundo são tratados com muita atenção,pode ser que não tenha nada a ver ,mas vou colocar um pouco do que li em "Ilusão Vital" de Baudrillard, "No momento em que o sujeito descobre o objeto,o objeto faz uma descoberta reversível,mas nunca inocente, do sujeito.Mais do que isso - trata-se realmente de uma espécie de invenção do sujeito pelo objeto inventado.Acho que é o que ocorre com a figura do vampiro que ri, é uma invenção feita pelo objeto do sujeito,seria o reflexo da civilização caótica em um resultado também caótico, com impacto no indivíduo social.

A arte gráfica japonesa parece ter nascido da necessidade de retratar figuras heróicas do antigo Japão, como os guerreiros “ronin”,fato que também ocorreu com o oculto e o fantástico, retratado por artistas como Katsushika Hokusai e Tsukioka Yoshitoshi.

Por mim eu diria que a obra de Maruo em questão,é como uma continuaçao dessas artes de raiz.Aqui o oculto é utilizado e jogado em um plano atual,e como já postei anteriormente no blog,o oculto é utilizado para descrever as extensões humanas que não são claramente percebidas pela lógica e ciência,portanto reforço,é um caótico estudo comportamental.

Repare quando Runa(uma das personagens)começa a se impressionar com o podre alheio,ela chama a própria irmã de vampira, fica louca com o que suas amigas de colégio fazem para conseguir dinheiro e boas notas,tudo isso é demais para uma menina aparentemente normal e de tranquila conduta,a vida de Runa muda quando Mori(outro personagem,o da capa) lhe derrama o sangue fazendo a beber e então também se torna vampira.

Repare também que Sotoo é diferente de Runa e Mori, ele não é um vampiro completo, ele recusa se tornar um deles, quase se torna,antes prefere combater até a morte, talvez para ele o fato de ser um vampiro completo seria insuportável e morre antes de assumir total consciência do que seria sua metamorfose final.

Mori e Runa conseguem rir da loucura da vida, como bem percebeu Rogério Campos, ao comparar o sorriso do vampiro com o de Johnny Rotten(vocal do "sex pistols").

Dai o resultado é parecido com o da música do metallica ,fight fire with fire: "Do unto others as they have done to you
But what in the hell is this world coming to?".

Warai-hannya(hannya risonha) ,será que a velha corcunda foi inspirada nela?

Oiwa


Mais do que pura arte, “O vampiro que ri” mostra possuir conteúdo político,já
que representa um tipo de entretenimento voltado para classes sociais de origem e gostos diferentes dos aristocráticos, como seria o caso da literatura do Marques de Sade,também apontado como uma influência,ao ler “O Marido Complacente”,essa idéia de que Sade é um autor de estilos mais aristocráticos ganhou força em mim,francamente esperava mais, vou procurar por “120 dias de Sodoma” e “Filosofia na Alcova”para me certificar de que não me engano.


Vale cada centavo.